Domingo de outono, fim de noite, assisto entediado a programação da TV aberta. Faustão berrando de um lado, Gugu e Rodrigo Faro do outro, Silvio Santos atirando aviõenzinhos de dinheiro na platéia, Paulo Henrique Amorim gritando que em poucos minutos iniciaria um outro programa de variedades e o jurássico fantástico se anunciando como grande atração a atuação de um mediador de Direito do Consumidor e a visita ao quarto do motel onde um empresário foi assassinado por sua ninfeta fatal ...ninguém merece.
Deprimido e arrependido por ainda não ter contratado uma empresa de TV por assinatura, resigno à mixórdia da programação dominical.
Que bela surpresa tive então!!!! Passo pelo canal Brasil que apesar do título convidativo costuma, em detrimento ao cinema nacional, passar uns filmes latino-americanos sem pé nem cabeça, neste horário de domingo à noite e assisto Conexão Roberto D’Ávila, que entrevista a cineasta Sandra Werneck.
Confesso que sinto uma pontinha de inveja dos cineastas e diretores de teatro. Imagine, trabalham com pessoas sensíveis e maravilhosas, como as Fernandona e Fernandinha, Renata Sorrah, Tarcísio Meira, Selton Melo e Paulo Betti, entre outros. Não quero nem pensar na alegria que deve ser dirigir Marieta Severo, Evandro Mesquita, Pedro Cardoso e Tonico Pereira em a Grande Família.
Passo pela TV Brasil e vejo uma mulher lindíssima na tela, parecendo até aquelas modelos balzaquianas das propagandas da Natura. Mas tinha ali uma atração que me prendeu de vez ao programa: a maneira de falar, a gestualidade, a leveza, a firmeza, a certeza, enfim, a mais completa noção de estar aqui no mundo e ter estórias para contar.
Não conhecia o pensamento nem a carreira de Sandra Werneck. É originalmente de classe média alta (para produzir seu primeiro filme vendeu duas vacas que o avô lhe presenteara) e mesmo assim trabalhou de garçonete em Amsterdã para realizar seu sonho de fazer cinema. Conseguiu, tem em seu currículo filmes como Cazuza – O tempo não para; Pequeno Dicionário Amoroso (baseado no fim de seu segundo casamento); Amores Possíveis; Sonhos Roubados; Meninas; Guerra dos Meninos; Damas da Noite entre outras obras profundamente marcadas pela temática social. Seu mais recente projeto é Marina e o Tempo, onde diz ter sido privilegiada por filmar a vida da ambientalista e política Marina da Silva.
Sandra Werneck merece todos os aplausos possíveis. É uma brasileira que antenada com nosso tempo e não se deslumbrou com a fama. Conhece as favelas do Rio, onde sempre filmou, lança novos talentos e corre em suas veias aquelas soluções reveladoras de laboratório. Tanto que sua única filha faz cinema na Europa. Sandra deu um autêntico baile na programação fajuta do domingo televisivo brasileiro. Obrigado Roberto, por tão belo presente.
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