quarta-feira, 18 de maio de 2011
Churrascão da Gente Diferenciada
A humanidade caminha a passos largos para um marco civilizatório cada vez mais pragmático e inclusivo. Chamou atenção na Internet uma convocação para um evento denominado: “Churrascão da Gente Diferenciada”, que foi um dos tópicos mais acessados no Twitter em maio deste ano e, faltando uma semana para sua realização já haviam sido listadas cerca de 14.000 confirmações. A página do ‘churrascão’ no Facebook é um sucesso e marca definitivamente no Brasil o início da militância desorganizada, porém antenada e engajada. Que motivo levaria seis dezenas de milhares de pessoas que nunca se vira, reunirem em pleno sábado em torno de um churrasco no meio da rua em um lugar tão aristocrático como Higienópolis? Por que o nome ‘Churrascão da Gente Diferenciada’? Tudo começou com um manifesto com 3.500 assinaturas de uma associação denominada ‘Defenda Higienópolis’, que se opôs à construção da estação do metrô no bairro, justificando que a obra atrairia “uma gente diferenciada", justificativa imediatamente abraçada e acatada pelo PSDB. A situação não se constituiu em fato isolado, pois, esta não é a primeira vez que o governador Geraldo Alckmin atende às pressões da burguesia contra construções do metrô. A Linha Amarela teve a construção de uma estação na Zona Sul cancelada pelo mesmo motivo, a freqüência de gente diferenciada.Vale ressaltar que Higienópolis é como Paris seria sem o Rio Sena: muito dinheiro e pouco charme. É um enclave burguês na paulicéia desvairada, onde tudo acontece sempre em alta velocidade e com muita diversidade. A ‘sampa’ que amamos é a de Florestan Fernandes, Mário de Andrade, Zé do Caixão e Tom Zé. A ‘sampa’ que cultuamos pariu o anarco-sindicalismo, a Semana de 22 e o ABC de Lula. Essa urbe multicultural e pluriétnica onde Rita Lee reina ao lado de Mano Brown e Netinho, jamais irá ‘bancar’ uma proposta de segregação, que nomeia os ‘sem Mercedes’ como ‘gente diferenciada’. Pois é, ao mudar de local a construção da estação da linha 6 do metrô paulistano, atendendo à xenofobia do grão-ducado local, o PSDB paulistano também mudou de trilho e assumiu sua plumagem real. Entrou na maior ‘saia-justa’ política com a população de São Paulo, quiçá do Brasil. A legenda que trava uma luta sem quartel para se livrar da pecha de representante da aristocracia nacional, ‘espirrou o taco’, se envolvendo com o que poderá ser a maior ‘sinuca de bico’ do tucanato dos últimos tempos. Se morassem em Canaãn, à época de Jesus, os burgueses de Heliópolis avaliariam Jesus e seus seguidores com muita atenção. Certamente malvestidos e cabeludos, apóstolos e Mestre não seriam recebidos com bons olhos pelos dandis do território. Convidados para uma festa de casamento, onde o vinho terminou antes da hora, o Filho de Deus operou seu primeiro milagre, transformando água em vinho conforme narra a perícopa bíblica em João 2, 1-11. Certamente, na hipotética Canaã, a avaliação dos Heliopolitanos sobre Cristo e seus apóstolos, seria que, filho de um carpinteiro, nascido numa gruta, sem ocupação fixa e com um grupo enorme de malvestidos a segui-lo, não poderia ser coisa boa para a cidade. Não diferiria muito da avaliação diária a que são submetidos Seus filhos contemporâneos que hoje habitam as grandes metrópoles. Vagando à espera de uma transformação, de um milagre, que lhes ofereça a cidadania e a justiça social, o pão e o vinho, a paz e o lar, família e trabalho. Com certeza Jesus Cristo e seus apóstolos seriam alcunhados pelos Heliopolitanos como ‘gente diferenciada’. O ‘churrascão’ aconteceu como previsto, no sábado, 14 de maio. Na véspera do evento, 60 mil pessoas já tinham se comprometido em participar da manifestação etílico-gastronômica. Não havia ‘chefetes’ políticos, sindicatos ou parlamentares oportunistas na organização do protesto. A ‘manif regabofe’ foi realizada defronte ao Shopping Higienópolis, reduto da elite local, com muita cerveja, samba e pagode. Para alegria geral, a única pimenta utilizada não foi a do ‘spray’ da Polícia Militar e sim a boa e velha malagueta, que temperava geral os espetinhos gordurosos e felizes.
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