Amauri Queiroz

quinta-feira, 10 de junho de 2010

A Economia Azul


"Fazer a barba acariciados pela suavidade de uma seda mais resistente do que o aço. Almoçar fungos superproteicos nascidos nos restos das plantações de café. Dormir em uma casa construída com o controle inteligente da temperatura e da umidade que os cupins desenvolveram ao longo de milhões de anos".

Gunter Pauli é um dos indutores da Economia Azul. O fundador da Zeri (Zero Emission Research and Initiatives) é oriundo da escola de Aurelio Peccei e do Clube de Roma. Pauli viaja suspenso entre a concretude das primeiras patentes e a sugestão de potencialidades ainda não aplicadas. Nos próximos meses, será publicado na Itália, pelas Edições Ambiente o seu último livro, "La blue economy. Dieci anni, cento innovazioni, cento milioni di posti di lavoro" [A economia azul. Dez anos, centenas de inovações, centenas de milhões de postos de trabalho].
Segundo Pauli, a economia verde é o hoje. É o conjunto de tecnologias quase largamente disponíveis e imediatamente convenientes. Alguns falam sobre ela no futuro, porque vivem em uma cultura velha, feita de balanços maquiados e de produções em liquidação, com os custos reais escondidos debaixo do tapete. Depois, chegam Chernobyl e o acidente da plataforma no Golfo do México, e todos entendem qual é o verdadeiro balanço das escolhas baseadas na energia nuclear e no petróleo. Portanto, a economia verde é uma possibilidade real, mas não é suficiente, não resolve os verdadeiros problemas.
Ele diz que o verde expressa a vitalidade das terras emersas, apenas um terço do globo. O azul é a cor do mar e é a cor do planeta visto do alto. O azul é o todo. Traduzido em termos industriais, quer dizer voltar-se à eficiência da natureza, eliminar completamente os dejetos. O ciclo linear de produção, com as mineradoras de um lado e os aterros de outro, produz desperdícios quase insustentáveis. Usamos as leis da física, da química, da biologia para inventar novos processos que eliminem a poluição e se transformem também em um bom negócio.
O livro de Pauli nasce de uma lista de 340 tecnologias inovadoras. Grupos de especialistas as analisaram durante um ano, selecionando 100 inovações consideradas realizáveis. Sobre estas, pode-se trabalhar de maneira concreta.
Alguns exemplos são visíveis no cotidiano: Quando bebemos um café, utilizamos só 0,2% da biomassa das plantas usadas. Os materiais descartados podem servir para fazer com que cresçam fungos de grande qualidade. Uma reconversão das plantações de café em 45 países criaria 50 milhões de postos de trabalho. Processos semelhantes podem ser idealizados para o açúcar de cana, que atualmente só se utiliza 17% do seu potencial, e para as árvores que são transformadas em papel, com um desperdício de 70%. O velho trabalho que produz mais dejetos do que objetos úteis deve ser substituído por uma biorrefinaria capaz, por exemplo, de extrair da celulose todos os componentes, da lignina aos lipídios: desse modo, podem-se substituir os polímeros derivados do petróleo.
No que tange a fazer a barba com seda, Pauli enfatiza que as potencialidades nesse campo são enormes. Basta pensar que centenas de espécies produzem seda, e só uma foi domesticada. A baba produzida por uma aranha tem a resistência e a flexibilidade superiores ao do aço. Para os materiais dos coletes à prova de balas, esses conhecimentos já foram utilizados. Pode-se abrir um novo campo de aplicação com as lâminas de barbear: significaria economizar a cada ano 10 bilhões de navalhas descartáveis, 250 mil toneladas de aço.
Segundo ele, devemos aprender com as baleias a como utilizar a energia para mover centenas de litros de sangue em milhões de quilômetros de artérias e veias. Com os atuns, a como conservar o calor. Com as larvas da farinha, a como produzir anticongelantes de modo natural. Com os besouros dos desertos africanos, a como coletar a água das chuvas. A zebra reduz a temperatura da pele graças ao jogo do branco e do preto, que cria microcorrentes de ar. Um refrescamento completamente gratuito que podemos imitar nas casas e nas cidades.
Na Alemanha, o Instituto Fraunhofer desenvolveu um método para aproveitar a eletricidade que deriva do calor do corpo: a diferença entre a temperatura do nosso corpo e a do ambiente ao redor, mais quente ou mais frio, é suficiente para produzir eletricidade. Quando os novos sistemas forem melhorados, bastará uma diferença de 0,3 graus para gerar a energia suficiente para fazer um celular funcionar.

terça-feira, 8 de junho de 2010

O Brasil e as Relações Internacionais



Os críticos do governo Lula, que geralmente não saem de plantão, se ouriçaram com a mais recente investida da chancelaria brasileira no caso do enriquecimento de urânio pelo país dos aiatolás.
O Brasil cresceu, não é mais o país que em épocas passadas segui a orientação dos EUA na seara das relações internacionais. Nos últimos anos, a posição brasileira no tabuleiro da geopolítica global cresceu de maneira significativa, revelando-se uma boa surpresa para alguns e desconfiança para outros.
Não é nenhuma novidade que nosso corpo diplomático é um dos mais preparados do mundo. A atuação brasileira no campo das relações internacionais sempre se pautou pela correção e por movimentos pacíficos de integração.
O Brasil é expoente e protagonista em alguns fóruns como o BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) reunião de países em desenvolvimento acelerado e que representa 16% do PIB mundial, abrange 42% da população do planeta, do qual detém 26% do território;
União de Nações Sul-Americanas - Unasul; Mercado Comum do Sul - MERCOSUL; Organização Mundial do Comércio - OMC; Organização Mundial de Saúde - OMS; Organização dos Estados Americanos - OEA e Organização das Nações Unidas – ONU, onde é membro do Conselho de Segurança, porém sem direito a veto. Em relação ao Conselho de segurança, Japão e Alemanha (segunda e terceira maiores economias do planeta que ficaram de fora por terem sido derrotadas na segunda-guerra mundial) e Brasil mais a Índia, formam o G-4, que pleiteiam a entrada no núcleo do Conselho.
A ação do Brasil na OMS é sensacional. Através de portaria assinada pelo presidente Lula, pela primeira vez em nossa história, um medicamento anti-retroviral (ARV) teve sua patente quebrada. Em cerimônia no Palácio do Planalto, Lula declarou de utilidade pública um medicamento protegido por patente, o anti-retroviral Efavirenz produzido pela multinacional Merck Sharp & Dohme (MSD) e utilizado no tratamento da AIDS. O decreto transferiu a patente da Merck para um laboratório brasileiro fabricar o remédio em território nacional. Até lá, o Brasil está autorizado a importar versões genéricas.
O desdobramento da ação resultou no projeto de Lei do Deputado Roberto Gouveia (PT-SP), que foi aprovado por unanimidade na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. O projeto autoriza o Governo a quebrar patentes de medicamentos para o tratamento da AIDS. A quebra das patentes proporcionará uma economia de R$ 200 milhões para os cofres públicos, além de manter universalizada a distribuição gratuita dos medicamentos, fato único no mundo.
No âmbito da OMC, a vitória sobre os EUA na questão dos subsídios, que autoriza o Brasil a impor retaliações aos americanos em resposta aos subsídios ilegais que o governo americano distribui aos produtores de algodão. O Brasil conquistou o direito de retaliar US$ 300 milhões sobre a patente de produtos americanos. Foi a segunda maior retaliação conseguida na OMC.
No campo da construção da paz e da solidariedade, enviamos tropas ao Haiti e participamos ainda do esforço de reconstrução daquele país, que sofreu a maior catástrofe natural dos últimos 100 anos, assim como atuamos como mediadores na manutenção da paz em Honduras.
No caso do programa nuclear iraniano, o Brasil e a Turquia tiveram um papel preponderante na distensão regional e mundial. O acordo defende o direito soberano à pesquisa nuclear para fins pacíficos. É o início de uma longa caminhada que tem como objetivo final a paz no Oriente Médio. O esforço do presidente Lula, o primeiro ministro da Turquia, Recep Erdogan e Mahmoud Ahmadinejad, presidente iraniano, causou imediata reação dos EUA, que rechaçou o acordo, recorrendo às tradicionais sanções no Conselho de Segurança da ONU, onde foi rapidamente seguido pelos seus pares. A postura norte-americana em derrocar o acordo demonstra claramente que o Brasil terá que enfrentar duras batalhas para vencer a postura colonialista e a “pax americana” imposta por nossos vizinhos do norte. O tabuleiro da política internacional é muito complexo, agora mesmo somos surpreendidos por um ataque de comandos israelenses a uma embarcação humanitária em Gaza que resultou em nove mortes. A posição americana é de que se instale uma investigação de padrão internacional e não uma investigação internacional, o que é bem diferente.
O governo brasileiro, duramente criticado pela oposição em relação à sua política externa, mostra que a máxima: “o que é bom para os EUA é bom para o Brasil”, caiu em desuso.
O novo protagonismo alcançado pelo Brasil corresponde, em primeiro lugar, à retomada – desde 2003 – da soberania nacional na política externa, ligada apenas aos interesses de nosso país e nosso povo e que, assim, afastou-se do costumeiro e automático alinhamento submisso às imposições do governo de Washington. Daí a oposição que ela enfrenta entre os setores neoliberais da política, da imprensa e mesmo da diplomacia brasileira.
Corresponde ainda à importância econômica que o país alcançou nos últimos oito anos, também derivada da recuperação da autonomia sobre decisões cruciais para uma política econômica soberana.

Futebol e Política - Gente Humilde, Medos e Esperanças.

O presidente da república e o técnico da seleção brasileira de futebol possuem algumas coisas em comum: têm em suas mãos as alegrias e angústias de uma nação. São responsáveis pelo orgulho nacional e pela manutenção do fim da “síndrome de vira-latas”, pecha criada e sentenciada no passado pelo teatrólogo Nelson Rodrigues. Tanto Lula quanto Dunga emergiram da esperança popular de se viver em um país menos amargurado.

Lula, renitente, amargou três derrotas consecutivas, sendo que todas elas eram lutas desiguais. A primeira, contra Fernando Collor de Mello, o “Caçador de Marajás”, um jovem dandi das alagoas, que surgiu como um super-herói justiceiro. A única salvação para um país mergulhado na corrupção e nas atitudes anti-republicanas. O noviço e dinâmico Collor de Mello foi a “arma letal” que a arcaica elite brasileira engendrou para derrotar as lutas populares e os movimentos sociais, origem e berço histórico de Lula.

Candidato “fabricado” pelo ainda incipiente marketing político tupiniquim, Collor de Mello caiu como uma luva nos dedos manipuladores da fábrica de fantoches políticos que é a grande mídia nacional. O povo estava tão envolvido pelo canto de sereia midiático, que até concordou e acreditou que o herdeiro do império Arnon de Mello não tinha recursos financeiros para adquirir um aparelho de som comumente utilizado pelas camadas populares. Fato risível veiculado nos estertores do debate eleitoral, juntamente com acusações de prática de indução ao aborto, ataques pessoais e maquiavelismos típicos da sórdida política coronelista.

A segunda derrota foi mais emblemática. O adversário não era mais o caçador de marajás e sim o grande intelectual, incensado nas maiores universidades do planeta. Herdeiro do Plano Real do mineiro Itamar Franco e dos salamaleques de grande parte da mídia e das elites brasileiras, viúvas de Collor. Mais uma luta titânica para o humilde operário nordestino, filho de mãe analfabeta, com a alma moldada no chão das fábricas, nos tornos e fresas das montadoras do ABC. Fernando Henrique Cardoso derrotou Lula na primeira e na segunda eleição, a da reeleição.

Lula parecia fadado aos compêndios e tomos do passado da história política do Brasil, como um ousado brasileiro que veio para São Paulo da longíngua Garanhuns, cidade nascida da luta quilombola, para tentar governar uma nação-continente como o Brasil.

Disse Euclides da Cunha em “Os Sertões” que “o sertanejo é antes e tudo um forte”. E Lula mais uma vez, calejado pelos açoites políticos, pelas infindáveis andanças pelo Brasil e sabedor que o povo não vive de láurea e desenvolvimento econômico e sim de bem-estar, mergulhou em mais uma campanha pela presidência da nação, aquela em que podemos afirmar que a esperança venceu o medo.

O Brasil mais uma vez assistia abismado a ascensão de um novo presidente onde, para os alarmistas de plantão, o futuro era excitante e ao mesmo tempo apavorante. As bolsas despencaram, os investidores desapareceram e a mídia permanecia catatônica com a onda popular e cívica que permeou a campanha e a vitória de Lula.

Oito anos se passaram e a esperança se renova novamente. O menino sonhador, filho de Dona Lindu, agora incensado pelos maiores líderes do planeta, pela sua luta contra a fome, pelo seu esforço hercúleo em prol da cidadania, dorme em berço esplêndido. Calejado pelas insídias das entranhas da política, imunizado contra o veneno destilado pelos inconformados por um pobre governar o Brasil com uma qualidade nunca vista, Lula nos orgulha, ao mostrar aos nossos filhos e netos, que o Brasil pode ser governado por qualquer brasileiro comum. Que aquela criança que estuda em qualquer escola pública do país, poderá um dia governá-lo. Obrigado, Lula.

Dunga também simboliza o “esforço de Sísifo” que é contentar 190 milhões de brasileiros com a escolha de 11 atletas que simbolizarão a pátria de chuteiras. Visto como solução para a tragédia grega de Wiggs, Dunga também é olhado com desconfiança por parte da mídia e da população. Substuto de Parreira, intelectual, pintor, frequentador da elite nacional, Dunga parece antever o que lhe espera caso não saia vitorioso na África. Espero, que se banhe na mesma fonte que Lula e se espelhe no grande “condottieri garanhuense”, mostrando da África para o mundo que a esperança no Brasil sempre vencerá o medo.